CAVACO SILVA: O PAÍS DO ALCATRÃO E DA ILUSÃO
( respondendo à declaração do candidato Marques Mendes de hoje - "Pode-se gostar ou não mas Cavaco Silva foi o melhor Primeiro Ministro de Portugal" )
As políticas
agrícolas da época levaram à perda de mais de 500 mil hectares de área
cultivada em poucos anos.
A frota pesqueira foi reduzida para cumprir as quotas comunitárias — centenas
de embarcações abatidas em troca de compensações.
A indústria, sem proteção nem estratégia, definhou perante a concorrência
externa, e o país passou a importar o que antes produzia.
Chamaram-lhe “reestruturação produtiva”. Mas a verdade é que se tratou de um
desmantelamento económico mascarado de modernidade. O país ficou
dependente de fundos e de importações, habituado à ideia de que o dinheiro vem
de fora e que basta aplicá-lo em alcatrão para parecer progresso. E enquanto se asfaltavam estradas e rotundas, as fundações do país iam sendo
corroídas. Criou-se a ilusão de riqueza, de estabilidade, de “país europeu”, mas o que
realmente se construiu foi um modelo económico de fachada — forte nas obras,
fraco na substância. A cultura foi
vítima colateral. Num tempo em que tudo era avaliado em números e crescimento, a
inteligência crítica passou a ser um estorvo. Não havia espaço para pensamento, apenas para “obra feita”.
O país ficou mais bonito nas fotografias, mas mais pobre na alma.
Trinta anos
depois, o saldo é claro: as estradas resistem, mas o país produtivo
desapareceu. E das estradas restam os pórticos e as barreiras de portagens para se continuar a pagar o que foi feito com os fundos recebidos.
Portugal tornou-se um país de serviços e dependências, sempre à espera da
próxima tranche europeia, sempre a justificar o presente com o passado.
A modernização de Cavaco Silva foi, no fundo, um pacto com a ilusão:
trocámos a autonomia económica por uma sensação de conforto momentâneo.