quinta-feira, 13 de junho de 2024

 

 


AEROGRAMA

 XIII-VI-2024              

 

Apareceu mais uma vez à hora marcada.

Senti-o na rampa descendente da vida, o que me preocupou, pois que tenho e mantenho sempre aquele sentimento da imortalidade. Como se fosse possível.

E não só dos outros mas também de mim próprio.

Chegou de manhã e após um breve momento e o finalizar de uma chamada telefónica de que lhe pedi desculpa, entrámos e sentou-se na cadeira do costume.

Foi rápido o começo de mais uma de muitas conversas, muitas sem sentido nem objectivo concreto, mas começámos e tomei-lhe a dianteira, pois não o fazendo com alguma determinação, seria difícil ou mesmo impossível dizer-lhe tudo o que a última noite de insónia me reservou para ele.

Nunca leu um livro, nem um jornal ou um artigo ou crónica jornalística que pudesse haver-lhe mudado o tom e o jeito, o défice de experiência com que levou a vida nas suas oitenta décadas e mais uns significativos pós de mais 5 anos.

E não o tendo feito, imaginarão o difícil que foi manter uma conversa amiga que perdura há 45 anos sem as constantes e sintomáticas gritarias – umas mais sérias que outras e algumas até paródicas que não é agora o tempo de as recordar.

Mas recordei-lhe os erros da vida que, ainda hoje lhe custam caro e a frequência cm que se dedica a repeti-los. Ainda hoje.

Não, não estava à espera da minha franqueza, destemor e firmeza na chamada de atenção e no alerta para o final do tempo de cada um, da finitude, dos melhores ou piores momentos que antes da irremediável partida haveremos de enfrentar. Mas agradeceu e deixou cair uma lágrima, sincera no momento do abraço de despedida.

Recordo que nos últimos 45 anos fez da vida uma roleta russa. Esta, a segunda aposta e será muito possivelmente a última bala que o revólver irá decidir se calha na frente do percutor.

Espero verdadeiramente que não.

Terminei com o abraço muito forte, um abraço daqueles que tão bem identifica e separa a amizade fraterna, entre homens sim e os amores perdidos ou mantidos, supostamente com que ainda se entrelaça.

Despedimo-nos assim, até um próximo e breve desaforo, confissão e ajuda que só a amizade consente.

E recordei-me então das “cantigas de amor”, das “de amigo” e nem sequer das de “escárnio e mal dizer”, pois não é isso que se trata.

Se sabedes novas do meu amigo,
aquel que mentiu do que pôs comigo!
ai Deus, e u é?

Se sabedes novas do meu amado,
aquel que mentiu do que mi há jurado!
ai Deus, e u é?

 

 

AV/

O BOM SISMO   !!! É que há sismos mesmo bons e que vêm por bem. Pasmem-se pois. Em boa hora, alguns portugueses acordaram hoje pelas 5h11 ...